Espaço Bizarro - Dead Man (1995)


Realizado por Jim Jarmusch
Com Johnny Depp, Gary Farmer e Mili Avital

Produção Indie de narrativa intrigante e uma das obras maiores de Jim Jarmusch (na qual é, mais uma vez, autor do argumento), “Dead Man” constitui, a par de “Django, Kill!” (1967), do primeiro bloco de “El Topo” (1970) e de “Walker” (1987), uma das raras referências surrealistas de qualidade, na temática do far-west Americano.
Psicadélico, impregnado de visões neo-realistas na linha de Jean Renoir ou John Ford, e anti-western assumido, “Dead Man” relata a espiral de alucínio e medo vivida pelo intrépido contabilista e homicida William Blake (Johnny Depp), alvo de uma impiedosa caça ao homem.


Se o acossado William Blake e as suas desventuras se aproximam do anti herói, é lícito afirmar-se que Nobody (Gary Farmer) – índio ocidentalizado que auxilia Blake, tomando-o pelo poeta londrino homónimo – e o seu clã, são a antítese da típica comunidade indígena. Em sintonia, aliás, quer com a insustentável unidade fabril onde Blake tencionava exercer contabilidade, quer com os seus inábeis perseguidores.
O culto do equívoco tende a ser generalizado, não deixando as suas consequências de gerar uma angustiante irreversibilidade. "Dead Man" não é, nem pretende parecer, um filme desestruturado ou casuístico. Mas consegue, num espírito Acid Western, atingir um nível de absurdidade e de ironia que permitem extravasar os tradicionais paradigmas do romantismo norte americano do século XIX.
Na sua derradeira sequência, corolário de 10 minutos desenrolados numa paradoxal aldeia índia, a resiliência de William Blake, burocrata naif, estranhamente apto a enfrentar vilões em território inóspito, a significância de Nobody, omnipresente nativo de cultura britânica, ou a presença silenciosa do enorme lago onde se dá o términus do filme, envolto pela bruma, sublinham a orientação da obra de Jarmusch: enquanto crónica metafísica acerca da incompreensão, da solidão e da inevitabilidade da morte, “Dead Man” pressupõe reflexão e disponibiliza, aos interessados em contemplá-lo, tempo e ritmo adequados.


De fotografia e iluminação irrepreensíveis – tudo é integralmente filmado a preto e branco, com sensibilidade e definição q.b. – e com uma banda sonora minimalista, assinada por Neil Young, “Dead Man” integra um elenco multi geracional de peso, do qual se destacam as aparições de Robert Mitchum (aqui no seu último papel), Crispin Glover, John Hurt, Billy Bob Thornton ou… Iggy Pop.
Em ano de grande competitividade em Cannes, a obra de Jarmusch acabou por arrecadar galardões de menor expressão, dos quais se realçam o "Screen International Award" (European Film Awards) e o "New York Film Critics Circle Award", na categoria de melhor fotografia, para Robby Müller, ambos referentes a 1996.

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4 Comentários

  1. Gosto, mas não chega aos calcanhares do Down By Law, apra mim. Ainda assim, concordo que a fotografia é irrepreensível e o filme é único.

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  2. A Palma de Ouro de 1995 foi para o filme Underground, do Emir Kusturica, e não para Ed Wood. Alias, Ed Wood não ganhou nenhum dos prêmios principais de Cannes.

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  3. Olá Narrador Subjectivo, obrigado pelo comentário.
    É(-me) difícil comparar dois bons filmes, ainda para mais sendo da autoria de Jim Jarmusch. O Down by the Law sempre me pareceu "raw" e mais experimentalista, ainda que tenha de o rever, sob pena de estar a dizer uma enormidade. Em Dead Man encontro um projecto maturado e fechado, ainda que eventualmente menos "user-friendly". Não só através de todo o cuidado depositado na produção, em comunhão com o espírito poético onde Johnny Depp se encaixa bem, como também no próprio argumento, mais subtil (e, arrisco, complexo) do que no Down by the Law. São proutos de tempos diferentes, e é difícil isso não se repercutir no resultado final de ambos. De resto, lembro-me de algumas imagens delirantes do Down by the Law: a fuga da prisão, num túnel escuro cheio de água, as imagens (decadentes) da periferia de New Orleans, ou... O bote, a afundar-se num pâtano labiríntico. Não me parecendo do mesmo campeonato do "Homem Morto", é, sem dúvida, referencial no seu tempo.

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  4. Felipe, tens toda a razão. Vou alterar o post.

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